Botafogo

Lembro-me da data da primeira vez que meu pai me levou no Maracanã: 8/11/1981. Eu não tenho uma memória prodigiosa para datas mas, neste dia, o Flamengo aplicou a famosa goleada de 6x0 no Botafogo. Ah! Torcemos pelo Botafogo. Foi uma experiência marcante. Apesar de ter apenas 6 anos, ainda tenho algumas memórias genuínas daquele dia. Por exemplo: sentamos nas cadeiras azuis. Hoje todos os assentos no Maracanã são cadeiras mas, na época, ainda se usava a geral - onde os torcedores ficavam de pé e serviam de alvo para objetos atirados da arquibancada, o lugar onde se torcia de verdade. As cadeiras ficavam abaixo das arquibancadas. Era um lugar considerado tranquilo. Tão tranquilo que as torcidas ficavam misturadas. Infelizmente, a visão do campo era sofrível. Depois que meu pai tomou coragem de me levar para as arquibancadas, fui somente mais uma vez de cadeira, num amistoso da Seleção em 1994 em que os ingressos para a arquibancada se esgotaram. Percebi que dali só dava para ter uma vaga noção do que se passava no campo.

No intervalo, meu pai foi comprar Coca-Cola num bar superlotado e só voltou depois de já iniciado o segundo tempo. Passado tanto tempo, o crime de abandono de incapaz já prescreveu e eu posso fazer essas revelações. A senhora que estava sentada ao meu lado me adotou enquanto eu estava lá, sozinho, e me ofereceu balas. Eu era alertado constantemente sobre o risco de aceitar coisas oferecidas por estranhos e, por isso, recusei. Como ela insistia muito, acabei aceitando e jogando-as discretamente no chão. Saímos do estádio enquanto ainda estava 4x0 e escutamos o grito da torcida do Flamengo comemorando o quinto gol no caminho para o estacionamento.

Meu primeiro jogo no Maracanã. Eu torço pelo Botafogo.

Não foi a única roubada em que nos metemos para assistir jogos do Botafogo. Em 1992, o Campeonato Brasileiro estava ali, na nossa mão. A final era contra o Flamengo mas o Botafogo nunca havia perdido uma final contra o Flamengo. Tudo bem que entre 1962 e 1989 o Botafogo nunca havia disputado uma final contra o Flamengo. O último título do Botafogo foi em 1968 e a última final que disputou foi em 1975 contra o Fluminense. Mas era um tabu. Em 1992, o Botafogo era movido pelos recursos que o bicheiro Emil Pinheiro injetava no clube e tínhamos um bom time, a ponto de sermos apontado como favoritos. Saímos de Friburgo para assistir ao jogo num domingo à tarde e voltamos com um belo 3x0 nas costas. Contra. Na saída, a torcida eufórica do Flamengo sacudia nosso carro, parado no engarrafamento. Tivemos que tirar as camisas e fingir que estávamos super felizes com o resultado.

Júnior destruindo o Botafogo em 1992
No ano seguinte, fui morar no Rio mas o time não ajudava. Aliás, o Botafogo raramente ajuda. Mas em 1995 fizemos uma boa campanha no Campeonato Brasileiro e finalmente conseguimos nosso primeiro título brasileiro. Assisti a todos os jogos no Rio. Até mesmo ao Caio Martins, o acanhado estádio em que o Botafogo mandava seus jogos de menor público, eu fui. Olhando para trás, fico admirado com quanto perrengue que eu já passei para assistir ao Botafogo. Se fosse mulher ele já tinha largado há muito tempo, mas time só se troca se ele acaba. Tipo o Juliano que era América e se tornou livre para torcer para qualquer time. Espero que ele não tenha escolhido o Botafogo, pois ser Botafogo é sofrido demais. Quando o Henrique me disse que não era Botafogo eu só tive uma preocupação:

- Você não é Flamengo, é?

Quando, ele disse que não, que torcia para o Grêmio, respirei aliviado.

Hoje em dia, minhas idas aos estádios são bem mais esporádicas. Fui duas vezes ao Engenhão, a primeira sob o pretexto de conhecer o estádio e, a segunda, para levar o Henrique a um jogo de futebol. Nos dois jogos que ele fez em Brasília, eu também estava lá. O último, aliás, foi ontem e, pra não perder o costume, teve perrengue. Apesar do público ser a metade da capacidade do estádio, ficamos mais de hora na fila para entrar e só fomos conseguir lugar quando o jogo já estava por iniciar.

Que jogo sofrível. Parecia que o Fred jogava com 10 Hulks pelo Fluminense contra 11 Hulks do Botafogo. Parecia que eles competiam para ver quem errava o maior número de passes. Depois da Copa do Mundo, ver o campeonato brasileiro é como ver o Brasil jogando contra o Brasil todos os fins de semana. Não que eu seja exigente. Sou Botafogo e estou acostumado com jogo ruim. Meu pai me levava ao Eduardo Guinle para assistir ao Friburguense jogar contra o Mesquita, Madureira, São Cristóvão ou Bonsucesso pela segunda divisão do Campeonato Carioca. Se o Fluminense é o quarto colocado do Campeonato Brasileiro da primeira divisão, estamos com sérios problemas.

Fred perdendo um pênalti

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