Barbara Gindl/Efe |
Barbara Gindl/Efe... -
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https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/afp/mobile/2013/11/23/austriaco-bate-novo-recorde-mundial-de-corpo-em-chamas.htm?cmpid=copiaecola
Logo que a tecla SAP ficou
disponível no Brasil, um comercial de TV simulava a cena de
um filme dublado em português em que o chefe diz a seu subordinado:- Você está queimado!
E o pobre do funcionário observa perplexo as chamas tomarem conta de seu corpo. Em seguida a mesma cena é reprisada com a tecla SAP ativada e, desta vez o chefe diz:
- You're fired!
"Você está demitido!". Agora sim. Ainda que fosse um comercial dirigido a um público bem restrito - aqueles capazes de assistir sem legendas uma programação em inglês - cada vez mais me lembro dele.
Já parou para pensar que aquele autor que você penou para ler pode não ser tão difícil assim? Que aquele trecho que você está há dias lendo e relendo sem entender o que o escritor quis dizer pode não refletir o que ele realmente quis dizer? Que o problema é que a tradução em que você está lendo é tão ruim, mas tão ruim, que a dedução que você tem que fazer não é mais sobre as ideias do texto original, mas sobre o que o tradutor fez do texto original? Estou cada vez mais convencido disso.
De Locke a Darwin, passando por Marx e Foucault o que venho observando é uma miríade de traduções ruins. Geralmente acabo recorrendo a uma edição em inglês para tentar captar o sentido de um trecho de um determinado livro e acabo fazendo isso com tanta frequência que, no fim, estou me perguntando por que diabos não estou lendo diretamente a edição em inglês já que ela está mais clara do que a tradução em português. E olha que, apesar de todos os certificados provenientes de anos e anos de Tortura Inglesa, digo, Cultura Inglesa, estou longe de ser um leitor fluente no idioma.
Trata-se de um problema que em maior ou menor grau atinge todas as editoras. De algumas desisti completamente. Não compro livros da Martin Claret desde que ela publicou uma tradução de "A origem das espécies" em que os cabritos monteses se tornam cabritos montanheses que se devoram uns aos outros. "Vigiar e punir" da Editora Vozes tem uma tradução tão ruim que me questiono como conseguiu chegar à 42ª edição. Mesmo a badalada Editora Boitempo, que se dedica à publicação de literatura marxista, tem traduções tão sofríveis que é difícil não acreditar numa conspiração do Instituto Mises para sabotar a propagação da obra de Marx.
Tudo bem que nem sempre é possível que uma tradução reflita fielmente o estilo de um escritor. Às vezes tratam-se de idiomas radicalmente diferentes. Porém, que essa mudança sirva para auxiliar a compreensão do texto, não para atrapalhar. Quando isso ocorre, não se está trabalhando na disseminação de conhecimento. Muito pelo contrário, atua mais no sentido de mistificar desnecessariamente um autor. Atua para dificultar a propagação de sua obra: "Não vou ler Marx porque Marx é difícil". Será? Ou será apenas que são as edições brasileiras que tornam Marx incompreensíveis para os brasileiros?
Estou começando uma nova seção no blog chamada "Você está queimado!" com o objetivo de expor problemas de traduções à medida que as leio. Vai durar somente o tempo de esgotar minha fila de livros já comprados. Depois disso, pretendo recorrer às edições em inglês que chegam no Brasil pela Amazon sem impostos e sem cabritos carnívoros.
Às editoras, deixo o recado: a tradução importa.
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