A Magia da Realidade

A Livraria Cultura é um programa legal. Só tem um problema: ainda que eu jure que não vou comprar nenhum livro antes de esvaziar a minha fila de leitura, sempre saio de lá com pelo menos mais um livro a ser colocado no final desta fila. Como Wandréa também curte a livraria - e como ela também tem o mesmo hábito de comprar livros sem ter esvaziado a sua fila de leitura - vamos lá com regularidade e compramos mais livros que as estantes do nosso aconchegante apartamento consegue acomodar. Há livros espalhados por toda a casa. Nas estantes. Sobre a mesinha de cabeceira. Dentro das gavetas da mesinha de cabeceira. Sobre a mesa da sala. No quarto das crianças. Atualmente, qualquer lugar que tenha área suficiente para acomodar um livro, ganha uma pilha deles.

Em uma destas ocasiões, comprei para Henrique um livro chamado "A Magia da Realidade", de Richard Dawkins. Segundo o autor, trata-se um livro de ciências ilustrado para o público jovem, escrito para que possa ser compreendido sem a ajuda de um adulto. Acredito que o objetivo tenha sido cumprido pois hoje, na hora do almoço, Pedro estava me contando como funciona a cadeia alimentar. O coelhinho felpudo e bonitinho come capim, é devorado pelo lobo que, ao morrer, é devorado pelas larvas até sobrar apenas os ossos. A decomposição é um processo nojento. Não entendi muito bem o que ele estava querendo me dizer até que ele me mostrou a página do livro onde este processo estava representado.





Do alto de seus recém completados 8 anos, Pedro é um leitor voraz. Outro dia levou sua coleção do Diário de um Banana para o colégio, para o choque do porteiro ao constatar o peso de sua mochila. Ontem foi a vez  do "A Magia da Realidade" ser lido no recreio.

Richard Dawkins é um biólogo renomado e um ateu militante. Um dos seus livros - "Deus um delírio" - afirma que um criador sobrenatural quase certamente não existe e que a fé religiosa é uma ilusão - "uma crença falsa e fixa". "A Magia da Realidade", porém, é apenas um livro de ciência e só pode ser considerado como defensor do ateísmo se você considerar que a ideia da existência de um deus é incompatível com o conhecimento.

Pedro me disse que seus colegas disseram que aquele era um livro de "adeu" porque falava do Big Bang e me perguntou se eu era religioso. Respondi-lhe que não, que eu era ateu. Mas como ele estuda em um colégio católico, disse-lhe que o Big Bang não era incompatível com o catolicismo pois há tempos que os católicos consideram a história de Adão e Eva apenas uma alegoria que não deve ser tomada ao pé da letra. Em seguida, mostrei-lhe o verbete na Wikipédia sobre Georges Lemaître que foi quem primeiro propôs a "hipótese do átomo primordial" que, mais tarde, veio a se popularizar com a alcunha de Big Bang. O que é bastante curioso é que nele, Georges Lemaître aparece vestindo uma batina. Quem primeiro postulou a teoria do Big Bang foi um padre!



Imagino que a maioria dos pais de seus colegas se intitulem católicos. Eu pensava, porém, que a tentativa de estigmatizar o conhecimento que vai de encontro ao que está escrito na Bíblia como coisa de "adeu" era restrito aos adventistas e a certas correntes evangélicas. Me choca que aos 8 anos as crianças já estejam sendo doutrinadas para recusar conhecimento dogmaticamente e me choca o quão rapidamente esta doutrinação é absorvida.

Negar o Big Bang, a Evolução ou a idade da Terra é como negar que a Terra seja redonda ou o sistema heliocêntrico. É validar o posicionamento de Richard Dawkins quando ele diz que a religião é uma justificativa para a crença sem evidência que, por sua vez, é um dos grandes males do mundo e que só pode ser combatida através da educação e conscientização.

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