Florianópolis

Florianópolis impressiona.

Impressiona a vista do pôr do sol sobre a Lagoa da Conceição, vista do mirante da Praia Mole.

Pôr do Sol sobre a Lagoa da Conceição

Impressiona a quantidade e a variedade de praias. Praias de mar aberto, propícias à prática de surfe. Praias de baía, de águas calmas e próprias para se levar crianças. Não dava para ser muito diferente. Estamos numa ilha, lembra-se?

Impressiona pela boa comida. Das sequências de camarão da Lagoa da Conceição às ostras do Ribeirão da Ilha, passando pela comida contemporânea dos bistrôs de Jurerê Internacional. Por falar em Jurerê, são impressionantes as mansões que lá foram erguidas.

Impressiona pela beleza das mulheres. Nas praias. Nos bares. Nas lojas. A caixa de supermercado. A trocadora do ônibus que um amigo azarou só para acumular mais um toco no currículo. Se as mulheres são lindas, não ia ser um cara feio como o Tico, cujo único atrativo era o de ser forasteiro, que ia se dar bem.

Fotógrafa

Falando em forasteiros, impressiona a quantidade de turistas argentinos que retornaram à Floripa desde que o real começou seu longo caminho ladeira a baixo. Nos restaurantes, nas praias, o idioma primário é o espanhol. Somente depois que descobrem que o cliente é brasileño, digo, brasileiro, é que a tecla SAP é pressionada e a conversa em português estabelecida. 

Como nem tudo pode ser perfeito, Florianópolis impressiona pelos engarrafamentos na saída da praia. Impressiona o acanhamento do aeroporto Hercílio Luz. Uma cidade com fluxo tão grande de turistas merecia um Aeroporto verdadeiramente Internacional que lhe servisse de cartão de visitas. Por falar em Hercílio Luz, impressiona pelo descaso com que a ponte homônima é tratada. Já nos anos 2000, em minha primeira visita à cidade, a ponte estava fechada e seu estado inspirava cuidados. 15 anos mais tarde, em minha terceira visita à cidade, impressiona sua resistência face ao abandono à própria sorte. Impressiona que ainda esteja de pé.

Nos hospedamos em Jurerê Internacional. O Booking.com apresentou uma mega oferta do "Villas Jurerê Hotel Boutique", dissipando qualquer dúvidas se nos ateríamos ao plano original de subir a Serra do Rio do Rastro, com todas as dificuldades que resolveram acompanhar a empreitada,  ou se aproveitávamos o fim de semana prolongado a dois. Valeu a pena. A Serra do Rio do Rastro começa a parecer com a minha historia em relação à Maratona de Paris. Por duas vez já me inscrevi. Por duas vezes desisti. Se ano que vem resistir à tentação de fazer as coisas do meu jeito e deixar a agência de turismo cuidar dos detalhes, ano que vem me inscrevo novamente e me concentro apenas em fazer força para subir.

Torres do Hotel Boutique

Na tarde de sexta-feira, explorando o entorno do hotel, nos vimos na praia vestidos como argentinos: camiseta, bermuda e tênis. À distância, do lado direito da praia, uma estrada subia uma subida acentuada e aguçou minha curiosidade para ver aonde aquele caminho ia dar. Sem bicicleta, o melhor a fazer era explorar o local correndo, logo pela manhã. Foi o que tratamos de fazer. A estrada levava em direção a Canasvieiras. Chegando lá, tive que explorar o local para encontrar o mar. Nesta parte da ilha, nem sempre há uma orla bem definida, uma avenida que corra ao longo da extensão da praia. As ruas perpendiculares levam em direção à areia mas a beira-mar é ocupada, na maior parte,  por casas e prédios particulares. Acabei encontrando uma passagem e uma rua com pequena extensão de rua que fugia a esta regra. Entre sotaques de argentinos que esperavam seus ônibus nas calçadas dos hotéis e de jovens cujo teor alcoólico elevado denunciava que a manhã nada mais era do que a continuação da noite anterior, cheguei num condomínio que se apresentava como o final do caminho e tive que retornar por onde tinha ido.

Não se deve repetir o caminho a não ser que seja a única opção. Tendo isto em mente, optei por tomar a direção oposta na manhã de domingo, correndo pela extensão da praia de Jurerê. A constatação do dia anterior também se aplica ao novo percurso. Não há uma avenida beira-mar. Desta vez, porém, as casas que se aproximam da praia dificilmente podem ser chamadas de casas. São mansões imponentes, em terrenos sem cercas, de vez em quando permeadas por avisos de vende-se. Encontro um trecho de pedras portuguesas que separa as mansões da praia e sigo nele até o final. O final, por sua vez, é uma ladeira cujas placas de informações turísticas informam dar num forte, a Fortaleza de São José da Ponta Grossa, fechada àquela hora da manhã. Uma trilha me levou em direção à Praia do Forte e eu corri pela areia, pulando os pequenos riachos que desaguavam no mar, até chegar ao seu final e tomar o rumo de volta. Ao invés de correr pelas mansões, a areia dura da Praia do Forte me encorajou a tentar a fazer o mesmo nas areias de Jurerê. A maré baixa revelou uma faixa de areia cuja largura não podíamos antever nos dias anteriores, quando as cadeiras de praia ficaram espremidas em direção às dunas e os chinelos tinham que ser vigiados para que não se transformassem em oferendas a Iemanjá.

Depois do café da manhã, fizemos uma despedida rápida da praia. Hora de fazer o check-out no hotel e dizer adeus à Floripa. Claro que ainda havia tempo para comer bem. O Ostradamus, no Ribeirão da Ilha, foi uma ótima escolha. Localizado no distrito de colonização açoriana e o maior produtor de ostras do Brasil, o restaurante faz parte da Associação dos Restaurantes da Boa Lembrança e o prato selecionado para o ano de 2016 é o delicioso e muitíssimo bem servido Sai Bruxa, um prato para dois que dependendo dos dois dá para três. O Ribeirão tem cara de cidade de interior. O casario, bem conservado, tem estilo tipicamente colonial e a Igreja Nossa Senhora da Lapa está datada de 1806. No dia em que lá estivemos, ocorria uma cerimônia de casamento. O jogo de dominó dos aposentados, típico de locais pacatos, rolava solto numa mesa à beira do mar. Somente os restaurantes e as lojas de artigos típicos, não do Ribeirão em si, mas de um lugar turístico, traiam a realidade.

Ostradamus

Nossa Senhora da Lapa

Fachadas do Ribeirão

Dominó

Infelizmente, é chegada a hora de devolver o carro na locadora e dizermos adeus, um longo caminho de volta com direito a conexão em São Paulo e a mais histórias na bagagem:

Revistas:

Acesso à sala de embarque do Aeroporto de Floripa. Revista. Raio-X, detector de metais e uma pilha de objetos perigosos descartados em exposição. Canivetes. Isqueiros. Cortadores de unha. Ainda falta mais de uma hora para o voo. Como de costume, não levei o carregador do celular e bateria está zerada. O livro da ida, Brasil: uma Biografia, de Lilia Moritz Schwarcz e Heloísa Starling, estava terminado. Procuro por alguma distração e a única alternativa que se mostra é um acanhado stand da La Selva. Livros, não há. Só revistas. Uma delas me chama a atenção. Não pelo seu conteúdo, o mesmo de sempre: nenhum. Me causa espanto, porém, que a Revista Caras, disponível em qualquer sala de embarque do país, ofereça como brinde um belo cortador de pizza. Metálico. De bordas afiadas.


Ainda que não seja um letal cortador de unha, imagino uma cena em que o sequestrador está com o cortador de pizza no pressionando o pescoço da comissária assustada, enquanto ele ameaça o comandante:

- Abre essa porcaria de porta senão vou fatiar a gatinha aqui fora...

Não me contenho. Tiro foto para postar no Facebook. Volto à checagem de segurança e chamo a atenção para o fato.

- Não podemos fazer nada, senhor. Nossa responsabilidade termina nesta porta.

Típico de quando os serviços deixam de servir ao seu propósito para se tornarem simplesmente um emprego. Uma funcionária intervém:

- É um daqueles cortadores redondos? Eles podem ser embarcados sem problema.

A voz convicta tenta transparecer que o cortador de pizza é um item que é transportado tão habitualmente na bagagem de mão que a checagem de segurança se depara com sua imagem nos aparelhos de Raio-X todo santo dia. Acho que, na verdade, a entonação foi adquirida e aperfeiçoada ao longo do tempo como um mecanismo para despachar passageiros chatos o mais rapidamente quanto for possível.

Diante de um argumento matador como esse, nada me resta a não ser me recolher à minha insignificância e voltar com o rabo entre as pernas para enfrentar o tédio que ainda me resta pela frente.

Há um médico à bordo?

A passagem foi comprada com milhas. Seria natural esperar que a companhia nos tivesse alocado nos assentos mais xexelentos  do avião, próximos à porta do banheiro, a frente da saída de emergência ou encostados na traseira do avião. 3E e 3F, na fileira conforto vendida por preço especial. Vai reclamar? Eu não.

Depois de 5 horas entre aeroportos e aviões, a sede é tamanha que comprar um refrigerante à bordo já não parece uma extravagância tão grande. A carteira já está fora do bolso quando percebo uma movimentação e uma cara de já era do comissário de bordo.

- Um passageiro da fileira 23 está precisando de assistência médica. Se houver algum médico a bordo, por favor identifique-se pela chamada de comissários com o seu CRM em mãos.
- Wandréa?
- Espera para ver se outra pessoa se apresenta.
- Repetindo: se houver um médico a bordo, por favor identifique-se através da chamada de comissários.

Apertei a campainha.

- O senhor é médico?
- Não mas ela é.
- Desculpe-me perguntar, mas qual a sua especialidade?
- Crianças. Eu cuido de nenénzinhos.
- Que bom. Um pai fechou a bandeja e prendeu o dedo do filho. A senhora pode dar uma olhada?

E lá se vai a heroína enfaixar o dedo da pobre criança. Paciente medicado, é hora de retomar o serviço de bordo. Massa. Continuo com sede e os comissários, envolvidos nos cuidados à criança, ainda nem ofereceram a água "de cortesia".

- Boa noite senhores passageiros, aqui quem lhes fala é o comandante. Devido ao incidente a bordo, solicitei e recebi autorização para proceder por uma rota prioritária, mais curta, para que a assistência médica em terra possa ser prestada ao passageiro que necessita de cuidados de forma mais rápida. Tripulação, preparar para pouso.

- Senhores passageiros, comunicamos que estamos encerrando o serviço de bordo.

Ainda não foi desta vez que cometi minha extravagância de comprar algo a bordo de um avião. Pelo menos economizei R$ 5,00.

Dicas de restaurantes: 

Com exceção do Ostradamus, fizemos todas as nossas refeições em Jurerê. Na nossa primeira noite, jantamos no Sérgio Lanches, desde 1999, o primeiro prensado da ilha. Não foi uma boa escolha. Nem a comida nem a bebida estavam legal.

No sábado, almoçamos no Sabor Jurerê, um buffet a quilo. A comida era honesta, apesar da pouca variedade. O jantar foi no Dona Joana Empório Bistrô. A rapidez com que o risoto foi servido nos deu a impressão que ele já estava completamente pronto não foi sequer finalizado na hora.

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