Porque o distritão é um péssimo negócio


Desde que Dilma foi eleita, parece que toda a causa com que me envolvo acaba derrotada, não importa o quanto ela me seja cara. Levy e seu ajuste fiscal. Eleição do Eduardo Cunha. Impeachment. PEC dos gastos. Reforma Trabalhista. Autorização para o STF processar o Temer. Para minha miséria se tornar completa, só falta os Tribalistas anunciarem seu retorno. Ao menos resta o consolo que, como todo torcedor do Botafogo, estou acostumado com as derrotas, principalmente as acachapantes.

A próxima causa que pretendo torcer pelo lado que será derrotado é a Reforma Política, especialmente no que diz respeito à adoção do Distritão como passo intermediário ao Voto Distrital Misto e daí rumo ao objetivo final: a substituição do Presidencialismo pelo Parlamentarismo.

No primeiro domingo de outubro de um ano par elege-se um novo parlamento. Na segunda-feira seguinte, logo após os Tribunais Eleitorais divulgarem o relação dos eleitos, descobre-se que o resultado não foi bem aquele que se gostaria. É quando se começa a ventilar na mídia a necessidade de se fazer uma Reforma Política que nos impeça de continuar elegendo parlamentos cada vez mais medíocres, como se o sistema fosse o responsável pelas escolhas erradas que fazemos.

É claro que o Sistema Proporcional de Lista Aberta que utilizamos possui problemas. Citando Winston Churchill, "a democracia é o pior sistema de governo que existe, excetuado-se todos os outros que são tentados de tempos em tempos". Não é a consciência de seus defeitos, porém, que deve nos fazer buscar um substituto à Democracia. Devemos aperfeiçoá-la constantemente, evitando  mudanças bruscas, se possível, dada a quantidade de pessoas que são afetadas em cada mudança. O mesmo deve se aplicar a um dos componentes de um Regime Democrático, o Sistema Eleitoral (erroneamente chamado de Sistema Político).

Infelizmente, prudência e cautela não são nossos fortes. Estamos sempre em busca de mudanças radicais que causem efeitos imediatos, invariavelmente disruptivas. Sempre que nos deparamos com um problema a palavra que nos vem à mente é "reforma". Reforma Trabalhista. Reforma da Previdência. Reforma Fiscal. Reforma Política. Tudo bem se encarássemos reforma como sinônimo de aperfeiçoamento. Só que não. Reforma para nós é jogar tudo fora e recomeçar do zero . É como se um casal que morasse numa casa de quarto-e-sala demolisse todas as paredes para reerguê-las com um cômodo a mais, num prazo de 9 meses, toda a vez que uma nova visita da cegonha fosse anunciada.

Das reclamações mais recorrentes em relação ao nosso sistema eleitoral vigente, destaco 4 delas:

  1. representatividade: Fulano não me representa. O partido X não me representa. O Congresso não me representa. Os políticos não me representam.
  2. renovação: os mesmos políticos só deixam de ser reeleitos quando passam o bastão para um de seus filhos.
  3. fragmentação: somente no Brasil existem tantos partidos políticos e é impossível governar tendo que fazer acordo com todos eles;
  4. custos de campanha: é muito caro eleger-se para um cargo e é por isso que se tem tanta caixa 2 em campanha eleitoral;
  5. distorções do sistema: Beltrano teve um número y de votos e não se elegeu apesar de ter mais votos que Sicrano que acabou eleito.
A seguir, pretendo demonstrar que esses problemas ou não existem ou não serão resolvidos com a adoção do Distritão. Longe disso, eles se tornarão ainda mais graves. Para não ficar parecendo que estou apenas de mi-mi-mi, vou finalizar com minha visão do que poderia ser feito para aperfeiçoar nosso sistema eleitoral sem ter que substituí-lo. Se conseguir lhe convencer, peço encarecidamente que me ajude a fazer campanha contra mais esse monstro chamado Distritão. Pode ser a última chance que temos de ter um sistema eleitoral que nos represente.

Muita da nossa aversão ao Sistema Proporcional é consequência do fato que não entendemos como ele realmente funciona. Pudera. Fomos condicionados a pensar que votamos num candidato para Deputado Federal, Estadual ou Vereador quando esse nunca foi o caso. A mídia apega-se a casos extraordinários, como o da imensa quantidade de votos do Tiririca que leva a reboque outros tantos candidatos de votação inexpressiva, mas falha miseravelmente em esclarecer que ninguém votou de verdade no Tiririca. Ao digitar o número 2222, o eleitor está votando no PR. Todos os votos no Brasil são na legenda (ou numa coligação de legendas) pois votar num partido é justamente a essência de um sistema proporcional.

Para tentar sanar essa falha de compreensão, vou descrever nosso sistema eleitoral da forma que ele realmente é, tanto do ponto de vista do eleitor quanto do ponto de vista de um candidato. Compreendê-lo é um passo fundamental para que possamos julgá-lo sob a ótica de um sistema proporcional e não como se ele fosse um sistema majoritário com nuances complexas e incompreensíveis, que é o que estamos fazendo desde que tiramos nossos títulos de eleitores.

Espero conseguir demonstrar que, apesar de todos os seus defeitos, ele é um bom sistema, possivelmente o melhor que podemos ter.

Entendendo o Sistema Proporcional

A grosso modo, o Sistema Proporcional é um sistema em lista. Um sistema em lista é aquele que o número de candidatos eleitos por um partido é proporcional ao número de votos que o partido recebe. Daí o nome "Sistema Proporcional". Esta é a primeira confusão que devemos esclarecer: no sistema proporcional quem recebe os votos são os partidos, não os candidatos.

O Sistema Proporcional pode ser em Lista Aberta ou Fechada. A Lista Fechada é o sonho de 10 em cada 10 caciques partidários e funciona da seguinte forma: os partidos apresentam previamente uma lista ordenada de candidatos:

Preferência PMDB PSOL
1 Jair Bolsonaro Chico Alencar
2 Eduardo Cunha Jean Wyllis
3 Leonardo Picciani Cabo Daciolo
4 Pedro Paulo Renato Athayde
5 Marco Cabral Paulo Eduardo

O eleitor analisa as listas e escolhe uma segundo seus critérios. Se o PMDB tiver votos, de acordo com o coeficiente eleitoral, para eleger 5 candidatos, parabéns a todos os candidatos do PMDB até o Marco Cabral. Se o PSOL tiver votos para eleger 3 deputados federais, parabéns para Chico Alencar, Jean Wyllis e Cabo Daciolo. Renato Athayde e Paulo Eduardo terão que se contentar em serem os 1° e 2° suplentes, respectivamente. A Lista Fechada é um sistema que possui alguns méritos:
  • Transparência: o eleitor sabe de antemão quais candidatos seu voto pode eleger e a probabilidade disso ocorrer conforme seu posicionamento na lista definida pelo partido;
  • Fortalecimento partidário: desfavorece a fragmentação;
  • Custo: é de longe o mais barato de todos já que a propaganda tem que ser feita apenas pela legenda e não por cada um de seus membros.
Por outro lado, há uma série de problemas inerentes à Lista Fechada: sua formação. Se deixada nas mãos da direção partidária, não é difícil constatar que o espírito corporativista tenderá a agir de forma a limitar a renovação parlamentar. Se hoje em dia o Congresso parece formado de dinastias, os mandatos sendo passados de pais para filhos, imagina o que ocorrerá quando a Lista Fechada for finalmente adotada através do tal Sistema Distrital Misto?

Outro grande problema da Lista Fechada reside na questão da representatividade. Para ser competitiva, a lista tem que jogar não só com aprovação como também com a rejeição de seus membros. Se a direção partidária entender que a presença de um homossexual assumido contribua mais para retirar do que para agregar votos, um candidato como Jean Wyllis pode ter dificuldade em se acomodar numa chapa.

A solução para esses problemas passa pela realização de prévias, com critérios claros e resultados que a direção partidária seja obrigada a respeitar. Neste caso, os eleitores decidem previamente a ordenação da Lista. Existe, porém, uma outra forma de se formatar o Sistema Proporcional deixando a ordenação da lista na mão dos eleitores:

A Lista Aberta:

A Lista Aberta é um Sistema Eleitoral em que a ordenação da lista é decidida pelos eleitores no dia da votação. Pode ser resumido da seguinte forma: o partido apresenta aos eleitores uma lista com todos os seus candidatos a um determinado cargo legislativo, ainda sem ordená-la. O eleitor, na Urna Eletrônica, escolhe um partido e, em seguida, pode optar por indicar um dentre os candidatos na lista que ele gostaria que fosse eleito. A lista é ordenada segundo a quantidade de indicações dos eleitores.

Esse sistema é de longe o menos transparente, já que os eleitores só saberão quantos e quais candidatos cada partido elegeu após a apuração dos votos. É um sistema em que as candidaturas são ligeiramente mais caras que a Lista Fechada, porém consideravelmente mais baratas do que as do Distritão. A possibilidade de fragmentação é alta mas, ainda assim, potencialmente menor do que a do Distritão. A grande vantagem da Lista Aberta reside na questão da representatividade já que possibilita às minorias se organizarem em torno de uma candidatura independentemente da vontade de direções partidárias.

Chegamos, enfim, ao tal Distritão:

O Distritão:

O Distritão é, de longe, o de mais fácil entendimento. É um sistema de votação Majoritário, tal como são as eleições para Prefeito, Governador, Senador e  Presidente, em que os votos são computados pelos candidatos, não pelos partidos como nos Sistemas Proporcionais. Na proposta tramitando na Reforma Política na Câmara, um estado corresponderia a um distrito e seriam eleitos tantos quantos deputados aquele estado faz jus. O Rio de Janeiro, por exemplo, possui 46 cadeiras na Câmara Federal. Nas eleições de 2018, os 46 candidatos mais bem votados seriam eleitos Deputados Federais. Parece justo? Se levarmos em conta a maneira como pensamos que votamos, sim. Na prática, ele resolve um problema que não existe (nas eleições de 2014, 40 dos 46 deputados mais bem votados foram eleitos pelo Rio de Janeiro) e agrava problemas que são apontados como as fraquezas do nosso sistema eleitoral.

Aliás, ainda não caracterizamos o nosso sistema eleitoral vigente. Você saberia dizer qual é? Creio que a maioria das pessoas não tem a menor ideia de que, nas eleições para Deputados Federais, Estaduais (Distritais, no caso de Brasília) e Vereadores, fazemos uso da Lista Aberta. Se o sistema parece confuso ou ruim, em que candidatos com pouca quantidade de votos são levados à reboque dos denominados puxadores de voto, talvez o problema não esteja no sistema em si mas na sua incompreensão por parte dos seus usuários que não leram o manual de instruções antes de usá-lo. É aí que entra o:

Manual de Instruções das Eleições para a Câmara de Deputados:

Caro eleitor. Como fazemos a cada 4 anos, é chegada a hora de escolher um novo parlamento. Para evitar mais 4 anos de lamentação, é necessário deixar claro que:

  1. O parlamento lhe representa. Você participa do processo de sua escolha, mesmo que não goste do seu resultado. Caso você opte por se omitir, anulando seu voto ou deixando de comparecer, tenha em mente que escolher não escolher já é, por si só, uma escolha e lhe dá menos direito ainda de reclamar mais tarde;
  2. O parlamento aprova o orçamento. Cada parlamentar faz jus à emendas parlamentares de execução obrigatórias. O parlamento pode aprovar aumentos de impostos e de contribuições. O custo de manutenção de um parlamentar é alto, um dos maiores do mundo. Esses alertas são para reforçar que seu voto tem uma grande influência no seu bolso. Vote com consciência ou esteja preparado para pagar o pato;
  3. As Eleições para a Câmara são feitas no Sistema de Lista Aberta. Tenha em mente que seu voto é dado a um partido e não a um candidato específico.
  4. Um partido elegerá candidatos na proporção de seus votos. É por isso que o sistema se chama "Proporcional".
  5. A quantidade de votos válidos para Deputado Federal divididos pelo número de representantes de um estado define o Coeficiente Eleitoral. Hipoteticamente, se o Coeficiente Eleitoral for de 150.000 votos e um partido tiver 500.000, ele elegerá 3 Deputados Federais.
  6. Após votar no partido de sua preferência, lhe é facultado indicar um e somente um candidato deste partido que você gostaria que estivesse presente na Câmara. Hipoteticamente, se um partido tiver direito a 3 cadeiras no Parlamento, os 3 candidatos daquele partido com mais indicações serão eleitos Deputados Federais.
Tendo aprendido como funciona nosso sistema eleitoral, vamos analisar aqueles que são apontados como seus maiores problemas, comparando-os com o que ocorrerá se o Distritão for adotado.

Fragmentação:

Não há a menor dúvida que no tal "Presidencialismo de Coalizão", lidar com 26 partidos políticos na Câmara dos Deputados é completamente insano. Essa situação ocorre, em primeiro lugar, pelo enfraquecimento das estruturas partidárias. Se você acha que os partidos não possuem identidade, coerência ideológica e se comportam como se estivessem sempre barganhando por cargos, é exatamente isso: seu diagnóstico está correto. Salvo raríssimas exceções, não há como se identificar com um partido do jeito que eles se apresentam.

Se o Sistema Proporcional atual já é ruim, imagine o que ocorrerá quando os candidatos forem os donos de seus próprios mandatos, obtidos sem a ajuda das máquinas partidárias. Na prática é uma situação que institucionaliza o Centrão, em que o governo tem que negociar não mais com cada partido, mas com cada parlamentar. A fidelidade partidária faz muito pouco sentido no Distritão.

Custo: 

Não há dúvidas que as eleições brasileiras são caríssimas, sendo urgente a adoção de mecanismos que a tragam para um patamar racional de gastos. O Distritão não é a resposta a esse problema, haja vista que vai encarecê-las ainda mais. Suponha que eu seja um candidato. Do meu ponto de vista, no sistema atual, um voto pode se encaixa em uma das 5 categorias:

  1. Voto na minha legenda. Eu sou o indicado;
  2. Voto na minha legenda;
  3. Voto na minha legenda com indicação de um outro candidato após ele atingir um número de votos igual ao coeficiente eleitoral para o cargo que estamos disputando;
  4. Voto na minha legenda com indicação de um outro candidato até ele atingir um número de votos igual ao coeficiente eleitoral para o cargo que estamos disputando;
  5. Voto em outro partido.
Simplificando, o voto em mim (1) possui um custo. É obtido às custas da propaganda que eu fiz como candidato. Todos os demais saem de graça para mim. A lista anterior está ordenada por ordem de benefício que cada voto me confere. As categorias (2) e (3) se equivalem para efeitos práticos. A indicação de um companheiro de chapa que exceda a quantidade de votos do Coeficiente Eleitoral beneficia igualmente todos os membros daquela chapa. A indicação de um candidato do meu partido (4) me beneficia, à medida que é um voto no meu partido, mas pode fazer com que ele fique na minha frente e me deixe de fora do número de vagas que o partido terá direito. Ele se torna um concorrente interno. O voto em outro partido é a pior situação possível mas, ainda assim, não tem custo para mim.

Observe que no Distritão, são eliminadas as categorias (2), (3) e (4). Só restam as categorias (1) e (5), voto em mim ou voto num candidato que não me beneficia. Daqui em diante, não há colaboração entre candidatos, mesmo que eles façam parte de um mesmo partido. Como baratear os custos de uma candidatura se eliminando todas as categorias que beneficiam um candidato sem lhe conferir custos, para mim é um mistério.

Deve-se ressaltar, ainda, que o custo de (1) é tão maior quanto mais desconhecido eu for. Desta forma, o Distritão vai favorecer ainda mais:

  1. Os candidatos ricos;
  2. Os candidatos que já são conhecidos pelos eleitores.
Um parlamento composto de ricos nós já temos. Não tem sido uma experiência muito boa. Favorecer candidatos que já são conhecidos dificulta a renovação e é justamente tudo o que não queremos segundo o diagnóstico que sempre se faz a respeito dos problemas do sistema eleitoral em vigor.

Representatividade:

O Distritão dificulta, em muito, a possibilidade das minorias se fazerem representar. Vamos pegar o caso de Jean Wyllis, desconsiderando as eleições de 2014 em que ele se reelegeu e, portanto, já se tratava de um rosto conhecido, e focar nas eleições de 2010 em que ele se elegeu pela primeira vez. Em 2010 ele recebeu míseros 13.018 votos ante um coeficiente eleitoral de 174.129. Ele só foi eleito  pelo fato do PSOL ter garantido 2 vagas naquele ano e ele ter sido o segundo candidato mais bem votado do partido.

A eleição de um candidato com poucos votos é visto como uma distorção do nosso sistema eleitoral. Gostaria de argumentar que, longe disso, é até uma de suas virtudes. Lembre-se sempre que estamos falando de um sistema eleitoral proporcional, em que os votos vão, em primeiro lugar, para a legenda e que a crítica só faria sentido se estivéssemos analisando um sistema majoritário, em que os votos são concedidos a um candidato.

Foi justamente por causa desta "distorção" que a comunidade LGBT conseguiu eleger um único representante na Câmara e, goste-se de Jean Wyllis ou não (eu particularmente gosto), creio ser consenso que todas as minorias devem ter voz em um parlamento. Se já é difícil que isso ocorra no sistema atual, o Distritão tornará a representatividade das minorias praticamente impossível.

O que pode ser feito?

Ao invés de derrubarmos todo o sistema e nos aventurarmos em algo que não se tem notícia em praticamente nenhum lugar do mundo, com um impacto enorme na vida de todos nós, por que não fazermos mudanças pontuais que aperfeiçoem o sistema à medida que os problemas forem sendo detectados? A título de provocação, você não acha que uma mudança no sistema eleitoral que seja de interesse dos membros deste Congresso não é necessariamente contrária aos seus interesses como eleitor?

Fim das Coligações Proporcionais:

Apesar de tudo o que descrevi anteriormente, não se vota realmente num partido no Brasil. Vota-se numa coligação de partidos, que pode ter membros diferentes em cada Unidade da Federação e que, finda as eleições, não têm a menor obrigação de continuarem coligados.

A coligação proporcional gera situações tão esdrúxulas como a observada no DF nas eleições de 2014, em que o PT se coligou, dentre outros partidos, com o PP e o PSC. O seu fim simplificaria o processo eleitoral, contribuindo para um melhor entendimento do sistema, além de reforçar o vínculo partidário com os eleitores, que podem votar de forma ideológica sem se preocupar que seu voto acabe favorecendo um candidato de um partido com o qual ele não tem a menor identificação.

Fidelidade Partidária, cláusula pétrea da Constituição:

Embora na teoria exista fidelidade partidária no Brasil, abre-se tantas exceções para se driblar a fidelidade partidária que, na prática, não há fidelidade partidária no Brasil.

Temos que ter em mente que no sistema atual, os votos são do partido, não do candidato. Em caso de desfiliação ou expulsão, o parlamentar deve perder automaticamente o mandato e o próximo da lista é chamado, a não ser que ele também tenha saído do partido por algum motivo qualquer. A Fidelidade Partidária tem que ser feita de forma que se torne automática, sem exceções, inapelável, não aberta a interpretações e, de preferência, que esteja estampada na própria Constituição.

Cláusula de Barreira:

O fim das coligações proporcionais e a aplicação dos mecanismos de fidelidade partidária já minimizariam, por si só, o efeito de fragmentação observado desde que o pluripartidarismo foi reintroduzido no país, em 1980. Deve-se salientar que a proliferação de pequeno partidos não é, em si só, um problema, sendo observado na totalidade das democracias no mundo e mesmo nos EUA, onde vigora um bipartidarismo de facto, existem dezenas de pequenos partidos que ocasionalmente acabam conseguindo algum tipo de representatividade regional.

Em 1995, aprovou-se através da Lei nº 9.096 uma cláusula de barreira que entraria em vigor a partir de 2007. No mesmo ano, duas Ações Diretas de Inconstitucionalidades contra ela foram impetradas, uma pelo PC do B, outra pelo PSC. Elas acabaram sendo julgadas e acolhidas pelo STF em 2006, 11 anos depois e às vésperas da lei entrar em vigor, quando já não se tinha mais tempo hábil para se tomar qualquer providência. Era uma legislação bastante razoável, que não impedia a representatividade dos partidos que não atingissem 5% de votos a nível nacional mas restringia alguns de seus benefícios: constituição de liderança, composição de comissões e acesso ao fundo partidário. Tudo o que realmente se deseja.

Tanto é que estão praticamente todas presentes na PEC 282/16, já aprovada em dois turnos no Senado e em tramitação na Câmara dos Deputados. Torçamos por sua aprovação pois ela também aborda a questão da fidelidade partidária, constituindo uma reforma muito bem-vinda.

Regulamentação da atividade partidária:

O acesso ao Fundo Partidário, em cada UF, só deve ser permitido aos partidos que não estejam sob administração provisória e que possuam e cumpram regras claras de sucessão da direção partidária, sobretudo com limitação do número de mandatos que podem ser exercidos consecutivamente. Mais ou menos como foi feito com as federações esportivas, através da LEI Nº 12.868, DE 15 DE OUTUBRO DE 2013. Atualmente, existem partidos que são geridos por comissão provisória em TODAS as unidades da federação.

A administração provisória-permanente acaba sendo um mecanismo que impede a participação dos filiados no processo decisório, propiciando a criação de feudos que, para piorar ainda mais a situação, são financiados pelo Tesouro através do Fundo Partidário.

Me parece surreal que, a essa altura do campeonato, esteja defendendo nosso sistema eleitoral. Há cinco anos atrás, porém, quem poderia me imaginar sindicalizado, tentando me decidir se me filio ao PT, PSOL ou PDT, defendendo Lula na grande questão nacional que se tornou a Lava Jato? Eu não.

Ocorre que, conforme outras mudanças que nos vêm sendo empurradas nestes últimos meses, as alternativas são tão piores que o melhor que podemos fazer é torcer para que o Governo Temer passe bem rápido, de preferência com um mínimo de mudanças quanto possível, eis que todas terão que ser revisitadas no próximo governo se quisermos ter um estado qualquer, nem que seja mínimo.

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